sábado, 28 de janeiro de 2017

conto de terror - conflito gerador

A LIÇÃO DA CAVEIRA


Há muito tempo, numa noite sem lua, ia um homem por uma estrada deserta e sombrosa. Nela havia um cemitério muito velho. Tão velho e maltratado que algumas ossadas estavam até à mostra, dando ao lugar um aspecto assustador.
Quando o homem passou pelo dito cemitério, avistou uma caveira quase à beira do caminho. Teve uma ideia sem ver nem pra quê: resolveu testar sua coragem diante do sobrenatural. Aproximou-se e, agachando-se, deu uma pancadinha com o nó do dedo no crânio alvo, perguntando, em tom de brincadeira:
-                      Caveira, quem a matou?
Como era de se esperar, não ouviu nenhuma resposta. Mas ele continuou com o gracejo:
-                      Caveira, quem a matou? – Nada outra vez. Então ele a apanhou, levou à altura do rosto e, dando vigorosas sacudidas, repetiu a pergunta.
Dessa vez, porém, foi diferente. Movendo a queixada esbranquiçada, a caveira lhe respondeu num tom soturno:
-                      Foi minha líííííínguaaa!
Por aquilo o homem não esperava. Tomado pelo pavor, largou imediatamente o macabro objeto e afastou-se impressionado com o que acontecera. Beliscou-se. Não estava louco; nem sonhando. A caveira realmente havia falado. Tinha certeza daquilo. Olhou para trás e a avistou. Parecia encará-lo com aqueles enormes buracos escuros. Um arrepio percorreu-lhe a espinha. Caminhou o resto da noite até que, o amanhecer, chegou a um lugarejo.
Casebres espalhados, velhos e malcuidados; parecia que a vilazinha havia parado no tempo, imersa numa atmosfera estranha. Naquela hora da manhã as pessoas começaram a sair das casas para os seus afazeres diários. Ao notarem a presença do desconhecido, dele se aproximaram, cheios de curiosidade.
Pois bem. Mal abriu a boca foi ele logo dizendo que tinha ouvido uma caveira falar no velho cemitério. E o povo dali, muito influenciável, tornou aquilo a principal notícia do dia. Tão impressionados ficaram que, certa manhã, formando uma pequena multidão, foram pedir ao forasteiro que os levasse ao cemitério e repetisse a façanha.
O homem, satisfeito com a fama que havia adquirido no seio daquele povo simples e ingênuo que o tinha como um santo milagroso, e crente de que conseguiria repetir o estranho feito, aceitou o pedido da comitiva. Partiram, então, imediatamente para o lugar onde acorrera o fenômeno.
Era mais de meio-dia quando chegaram ao local.
Ali o forasteiro organizou todo o povo em círculo, no meio do cemitério. Apanhou a mesma caveira que havia largado dias antes e, para impressionar a excitada plateia, gritou com uma voz rouca e profunda.
-  Caveira, quem a matou?
Nada.
-  Caveira, quem a matou? – repetiu.
Outra vez, nenhuma resposta. O povo, inquieto, começou a se rebelar e o homem, já nervoso, explicou que antes a caveira só lhe respondera quando havia feito a pergunta pela terceira vez. Todos, então, se acalmaram aguardando cheios de expectativas. Já suado e nervoso, tornou a gritar:
-  Vamos, caveira, responda para esta gente! Quem a matou?
Mais uma vez, porém, o silêncio foi a resposta.
Dessa vez um silêncio mortal. O homem percebeu, assustado, a multidão que se sentiu ludibriada caminhar em sua direção. Olhos vidrados, expressão furiosa nos rostos, andavam lentamente, como uma turba de mortos-vivos. Pegavam o que podiam no chão: paus, pedras, restos de cruzes, ossos. Enquanto fechando o cerco em redor do assombrado estranho, esbravejavam, em coro, chamando-o de mentiroso, embusteiro e enganador.
O povo enfurecido parecia dominado por alguma força sobrenatural. Usando os objetos como armas, investiu contra o forasteiro. Foi um massacre. Nada deteve a multidão, que, a cada súplica do infeliz, parecia mais revoltada.
Depois do ataque, cada agressor retirou-se do local. Lá abandonaram aos abutres o corpo do forasteiro.
Quando, ao cair do sol, o local voltou a ficar deserto e silencioso, a caveira, então, soltou uma estridente gargalhada e disse:
- Eu não falei que a língua matava?

Flávio Moraes. Em: “Sete contos de arrepiar”.


. Assinale o trecho do conto “A LIÇÃO DA CAVEIRA” no qual ocorra o conflito gerador da história:
a.O povo enfurecido parecia dominado por alguma força sobrenatural. Usando os objetos como armas, investiu contra o forasteiro. Foi um massacre. Nada deteve a multidão, que, a cada súplica do infeliz, parecia mais revoltada.”

b. “Quando o homem passou pelo dito cemitério, avistou uma caveira quase à beira do caminho. Teve uma ideia sem ver nem pra quê: resolveu testar sua coragem diante do sobrenatural. Aproximou-se e, agachando-se, deu uma pancadinha com o nó do dedo no crânio alvo, perguntando, em tom de brincadeira(...)”

c. “Há muito tempo, numa noite sem lua, ia um homem por uma estrada deserta e sombrosa. Nela havia um cemitério muito velho. Tão velho e maltratado que algumas ossadas estavam até à mostra, dando ao lugar um aspecto assustador.”

d.Quando, ao cair do sol, o local voltou a ficar deserto e silencioso, a caveira, então, soltou uma estridente gargalhada e disse: - Eu não falei que a língua matava?”

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